quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Cinema, Brasil e Violência

Liliam Freitas

Filmes como Cidade de Deus, Tropa de Elite, Carandiru e Ultima Parada 174 ainda causam polêmica. Há quem considere uma exploração e saturação da temática ou/seja da opinião de que não existe a violência pintada por eles em terras tupiniquins, pelo menos não como ela é retratada na telona.

Infelizmente, a violência colocada nesse filmes não é uma invenção do Cinema. Ela está aí, no noticiário, nas nossas vidas, dentro e fora de casa. Alguns críticos parecem negar a existência dela como um problema, ainda mais social. E se ela inexiste, não se pode mostrá-la para todo o mundo (Paris, Hollywood, Londres), caso contrário irão pensar que o Brasil é só violência.

Cidade de Deus, de Fernando Meireles evidencia a questão, assim como Carandiru, de Hector Babenco, Tropa de Elite, de José Padilha e Última Parada 174, de Bruno Barreto de maneiras diferentes. A violência está presente permeando as relações em todos os longas.

Em Tropa de Elite, a narrativa é contada pelo capitão Nascimento, do Batalhão de Operações Especiais da Polícia, uma espécie de elite da instituição policial que tem como função controlar o universo das favelas cariocas e a violência.

O BOPE assim como a PM, inclusive o capitão Nascimento, abusam da violência, da truculência, do castigo físico, da tortura, do desrespeito aos direitos humanos. Mesmo assim o protagonista do filme que deveria ser odiado e execrado, é idolatrado e reverenciado. Claro que o fato da história ser construída sob a única voz do capitão bopista colabora para a ascensão da personagem para o status de mocinho e de que a violência é a solução. Explica parte não tudo. Muito mais precisa ser dito na relação Brazil e violência.

Primeiro, a questão é social ainda continua (mal) entendida como questão de polícia. Sendo assim a violência se resolve com policia e muita porrada. É assim a compreensão e concepção do Capitão Nascimento, dos seus seguidores, de muitos governantes e da maioria dos brasileiros. Em meio a uma infinidade de favelas no Rio em que a PM e o BOPE tentam mantém sobre controle e tem muito trabalho, se pergunta como é que a violência cresce(u) tanto. Teresa Pires do Rio Caldeira, em Cidade de Muros: Crime, Segregação e Cidadania em São Paulo, responde. Segundo ela, a violência aumenta porque as instituições da ordem, que deveriam reduzi-la, contribuem para seu crescimento. Esse aumento se reforça com a negação do Estado de Direito e Bem Estar Social.

A PM e o BOPE do filme, assim como os policiais tupiniquins, utilizam a violência e não pautam seu trabalho e conduta no respeito aos direitos dos cidadãos. “A polícia brasileira exercia a violência de diversas maneiras do século XIX. Legalmente ela detinha o poder de punir escravos” (pag. 144). O padrão da polícia até hoje tem sido esse. O mais contraditório é que essa violência polícia tem apoio e aceitação popular. A instituição policial é vista como solução do problema e não como parte.

Teresa Pires do Rio Caldeira defende que a redução do crime passa por uma história de consolidação da autoridade do Estado e suas instituições de ordem como policia e sistema judiciário e a legitimação dos direitos individuais. No Brasil, a violência está na ação do Estado, na ausência do judiciário, das pessoas que apóiam a prática da policia assim como o marido que bate na esposa, da mãe que espanca o filho, da babá que maltrata o neném indefeso. Violência também no âmbito doméstico. Ingenuidade pensar a casa como um espaço de proteção em que não haja violência. Já está tudo dominado, como diz a letra do funk.

Na esfera pública grandes abusos, um exemplo é do esquadrão da morte, os membros desse grupo queriam mostrar o bom desempenho na luta contra o crime. A forma de fazer isso era eliminar (leia-se matar) os “criminosos”, nem precisa de julgamento, assim acabaria o crime.

Enfim, a violência é constitutiva de várias dimensões da vida social nacional. Isto é, a violência também é Brasil, não coloca isso na tela é negar o Brasil.

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